Não, eu não pedi para ser assediada

Não, eu não pedi para ser assediada

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Eu tinha 16 anos quando fui assediada sexualmente. Sim, aqui relato tanto sobre feminismo, mas que já sofreu e morreu (ainda morro) de vergonha de falar sobre o assunto. As consequências ainda doem, demorei muito para confiar nas pessoas e confessar os hábitos, tive todos aqueles sentimentos, como ficar chateada, se sentir culpada e até me martirizar por conta disso. Por ter tido uma criação católica, me sentia uma qualquer quando lembrava que aquilo aconteceu, que o cara colocou a minha mão no pênis dele em um lugar público foi porque eu quis e não por consequência do machismo dele. Me lembro que cheguei em casa em choque, chorando copiosamente e minha mãe tentando entender o motivo de ter ficado assim. Duas horas depois, o assediador me liga pedindo desculpa e dizendo que nunca mais aquilo iria acontecer. Mentira, na semana seguinte, ele tentou (de novo) apertar meus seios e eu dei um forte tapa na cara dele.

Inicialmente, este texto era para ser mais um textão de Facebook, porém achei melhor colocar por aqui.

É a primeira vez que anuncio isso publicamente e será a última, pois este texto surgiu após ouvir um comentário que as mulheres pedem para ser assediadas.

Eu não pedi, só queria era ter um dia romântico e feliz. Mas não foi isso que aconteceu. Resultado? Me fez demorar muito arrumar um namorado e ter confiança nos relacionamentos afetivos, ter crises de ansiedades cada vez mais fortes ou até ter crises de baixa estima. Até hoje, quando lembro, tenho os piores sentimentos em volta de mim.

Só descobri o que aconteceu comigo foi um assédio sexual aos 20 anos, quando fui fazer terapia e relatei o que tinha ocorrido. Somente falei aos meus pais aos 22 anos, no qual até hoje não compreendem o fato e não os culpo, pois eles cresceram achando que assédio sexual era feito por um taradão esquisito que está no meio da rua, mal sabiam que parentes ou parceiros amorosos poderiam fazer algo do gênero. Eu também pensava que um assediador poderia ser um cara que não está no meu ciclo social, mas mentira.

A gente acha ainda normal um rapaz de quarenta anos se apaixonar por adolescentes e que isto é romântico ou um cara roubar um beijo de uma garota durante uma micareta. A gente passa a mão na cabeça de muitas celebridades que fazem isso corriqueiramente e o que aconteceu com o ator da novela das 8 pode ser o início de uma mudança de comportamento.

O caso de José Mayer repercutiu bastante o questionamento sobre o que é um assédio sexual. Recentemente, eu ouvi um relato de uma mulher dizendo que foi a própria figurinista que se insinuou para ele. Mas, o que infelizmente esta senhora não sabe é que um assédio pode ser feito pelo próprio marido dentro de casa, quando ele força a parceira a ter relações sexuais ou apalpá-la sem autorização. O estupro é muito mais comum que a gente imagina e o slut-shaming, o ato das pessoas humilharem mulheres por postar ou vazar nudes também ou desqualificá-la dizendo que “ela não é para casar” por usar roupa curta e mostrando os dotes, mais ainda.

Além disso, o caso de Zé Mayer fez com que outras vítimas do ator também anunciassem sobre o assunto, como a atriz Letícia Sabatella.

Quem nunca ouviu que uma garota era puta, só pelo fato de gostar de fazer amassos? Começa isso na escola e continua na vida adulta. Sim, nós ouvimos muitas vezes e até mesma eu falei isso. Mas, o fato dela ter uma vida sexual mais livre que a minha não traz o direito algum de chamá-la de puta ou outros adjetivos nada jocosos. O comportamento sexual da mulher já é muito massacrado desde o nascimento até a velhice.

A criança não pode pensar em arranjar namorado, tem que esperar o rapaz aparecer em volta dela para cortejar. Ela não pode se satisfazer sexualmente, o cara que tem conduzir o coito. Na velhice, mulher não pode transar, tem que cuidar dos filhos e do velho. Enquanto isso, o homem pode fazer livremente o que quiser. Mas nem todas as mulheres querem se encaixar nessas características e temos que respeitar essa opção de todas as formas. Mesmo que a mulher não concorde com a sua opinião, acolher quando ela precisa se chama sororidade e empatia com os problemas alheios, foi isso que aconteceu com o caso do BBB e evitou que agressões piores entre o casal ocorressem.

Por favor, não julgue, escutem as mulheres!

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Sobre lara

Jornalista e publicitária formada pela UFRN, começou despretensiosamente com um blog para treinar seu lado repórter e virou sua vitrine. Além disso, é mestranda em psicologia na UnP e ainda é doida o suficiente para começar mestrado em Estudo da Mídia na UFRN. Saiba mais sobre esta brechadora.

Desenho: @umsamurai.



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